O
SENADOR DE UM MILHÃO DE VOTOS
Na
eleição para senador da República realizada em 2010 no Rio Grande do Norte,
Garibaldi Alves Filho, apuradas todas as urnas, contabilizou a seu favor
1.042.272 votos. Esse número se torna mais expressivo porque aquele pleito foi
um verdadeiro choque entre três campeões de voto: o próprio Garibaldi, José
Agripino Maia e Wilma Maria de Faria. A trajetória política do entrevistado que
estreia as páginas do SUPERPAUTA é
bastante conhecida do povo potiguar e pode ser pesquisada na Internet e nos
diversos veículos de comunicação do Rio Grande do Norte. Aqui, o leitor conhecerá
por outro ângulo um resumo do que já viveu o atual ministro da Previdência
Social. Garibaldi recorda detalhes da infância, revela cenas inéditas de sua
vida pública e fala sobre alguns dos sonhos que ainda acalenta, entre outros
assuntos. Convido todos a acompanharem a história desse político que – mais do
que um milhão de votos – amealhou uma quantidade inestimável de admiradores e
amigos. (robertohomem@gmail.com)
SUPERPAUTA – O senhor
nasceu em Natal...
GARIBALDI – Eu nasci na
Maternidade Januário Cicco. Os meus pais moravam na Princesa Isabel, uma transversal da Ulisses Caldas, no centro da cidade. Minha infância foi toda
vivida naquela região, que era inteiramente diferente do que é hoje. Para você
ter uma ideia, se jogava futebol no meio da rua! Um dos meus colegas daquela
época foi Marcos Tassino. Ele foi vice-prefeito de Pedro Avelino e chegou a
ocupar a prefeitura. É um médico muito conhecido.
SUPERPAUTA – Sua posição
era mais no ataque ou na defesa?
GARIBALDI – Eu jogava
mais na defesa, mas não havia muita orientação tática. Aliás, sequer havia um
técnico. Às vezes eu também atuava no ataque. Depois, na adolescência, joguei
na Rua Trairi. Meu pai foi morar ali bem embaixo da Ladeira de Mãe Luiza.
Também jogávamos ali com vários jovens conhecidos, amigos até hoje, como meu
primo Francisco Alves. Lembro também de Carlos Andrade, de Hilton, Zé Roberto,
Zé Rogério e outros. Na verdade, como futebolista eu não passei disso aí.
SUPERPAUTA – Quais eram outras
brincadeiras daquela época?
GARIBALDI – Em termos de
esporte, eu gostava de pingue-pongue. Max Azevedo e Josefina são vizinhos dos
meus pais desde quando eu era menino, até hoje. Max é professor da Universidade
Federal. Ele dizia que eu transmitia jogo de futebol. Que ouvia, de sua casa,
essas transmissões que eu fazia. Outra brincadeira daquele tempo era aquela que
se marcava no chão...
SUPERPAUTA – Academia?
GARIBALDI – Sim, era tipo
academia. Por aí.
SUPERPAUTA – O mar também
lhe atraía?
GARIBALDI – A descoberta
do mar se deu quando, menino ainda, eu veraneei na Redinha. Minha
Aniversário de cinco anos |
convivência
com a praia, como veranista, ocorreu inicialmente nessa casa onde meu pai
veraneou. Depois, fui muito à Ponta Negra. Naquele tempo as pessoas veraneavam
lá. Fui um desses veranistas. Hoje não existe mais isso. Depois da construção
do conjunto, acabou-se o veraneio. Mas, o mar me pregou algumas peças. Passei
um tempo hospedado em um hotel da Via Costeira enquanto faziam uma reforma na
minha casa. O mar naquela região nunca foi tranquilo. Certo dia, tomando banho
com meus filhos, de repente eles foram envolvidos por um caldeirão (redemoinho).
Fui atrás para tentar salvá-los, mas terminei sendo puxado também. Para nossa
sorte, nas proximidades estava um soldado que morava em Mãe Luiza. Foi ele quem
nos trouxe de volta. Outra vez, quase que eu e Denise, minha mulher, fomos
tragados pelo mar, enquanto tomávamos banho em Genipabu. Quem nos salvou foi
Jussier Santos, que tinha uma casa de praia vizinha à de papai. Hoje essa casa
do meu pai está quase que totalmente destruída pelo avanço da maré. É bom
ressaltar que essas duas experiências com o mar não me deixaram sequelas ou
medo. Só acho que eu deveria ter sido poupado pelo fato de nunca ter me
aventurado ou desafiado o mar, como costumam fazer o velejador Lindolfo Sales e
o mergulhador Roberto Furtado, além de tantos outros.
SUPERPAUTA – Qual sua
ligação com Angicos, a terra de sua família?
GARIBALDI – Passei um
período da minha vida entre o sertão e o mar. Tenho muitas recordações do
sertão porque foi lá onde ingressei na política. Muitas pessoas pensam que a
minha militância iniciou em Natal, mas isso ocorreu no interior, pois meu pai era
líder político em Pedro Avelino. Eu, menino ainda, participei de muitas
campanhas animadas no interior. Durante a campanha de Aluízio, em 1960, todos
os dias havia um baile no comitê. Fui passar as férias em Pedro Avelino no
mesmo período da campanha. Dessa época vêm as primeiras lembranças políticas. Comecei
nessa convivência com a política interiorana. Eu era bem novo, mas as pessoas
gostavam de ouvir a minha opinião, inclusive os mais velhos. Sempre convivi com
pessoas mais velhas, justamente por conta da política. Guardo muitas
recordações de Angicos, mas as lembranças de Pedro Avelino são maiores. Uma
grande frustração aconteceu em uma viagem de Pedro Avelino para Angicos, quando
o carro de papai quebrou. Por conta dessa pane, não pude assistir à aula de
Paulo Freire que marcou o encerramento da experiência de alfabetização em 40
horas, que ocorreu em Angicos. Agora mesmo se completou o cinquentenário e eu
também não pude estar presente. Naquela ocasião há 50 anos, adolescente ainda,
eu estava ávido para estar em Angicos naquele dia. Não apenas pelo fato da
experiência, mas eu queria ver o presidente João Goulart e Paulo Freire. Depois
fiquei sabendo que o marechal Castelo Branco, então comandante do IV Exército,
também estava lá. O governador era Aluízio Alves. Eu perdi tudo aquilo. Fiquei
no meio da estrada. Quando conseguimos chegar a Angicos, a formatura já tinha
ocorrido.
SUPERPAUTA – Onde foram
seus estudos em Natal?
GARIBALDI – No Marista. Há
até um episódio dessa época que contei em algumas campanhas, especialmente na
de prefeito. O presidente do diretório dos estudantes era Ney Lopes de Sousa. Certa
ocasião, fui escolhido para ser o orador em uma homenagem a Dom Nivaldo Monte.
Era o meu discurso de estreia e a primeira vez que eu usava um paletó. Só que o
paletó era tão comprido que até hoje eu tenho um pouco de complexo. Sempre que
vou sair de casa, ou quando compro um paletó novo, pergunto logo se ele está
muito longo. Tudo isso porque, no dia desse meu primeiro discurso, quando mal
eu comecei a falar, um gaiato lá atrás gritou: “engole, paletó!” (risos). Quase
que ele acaba o meu discurso. Mas, do Marista, fui para o Atheneu fazer o curso
clássico. Infelizmente não tive a oportunidade de ter como professor Câmara
Cascudo, que já tinha se aposentado. Mas o Atheneu era uma referência, um
colégio público com trajetória vitoriosa. Depois passei no vestibular e fui para
a faculdade de Direito. Quase a totalidade do meu curso foi ainda na Ribeira. Fui
aluno de Edgar Barbosa, Manoel Varela, Cortez Pereira... Cortez Pereira me
reprovou por meio ponto, em uma matéria eliminatória.
SUPERPAUTA – Foi mesmo?
GARIBALDI – Sim, mas
depois tive a oportunidade de me vingar dele, quando fui líder da oposição ao seu
governo (risos). Cortez tinha sido nomeado pelo governo militar. A oposição, naquele
tempo, não era como a que existe hoje no Rio Grande do Norte. Era uma oposição
muito radical, feita por uma bancada muito jovem, que, por conta dessa pouca
idade, era denominada “Jardim de Infância”. Henrique foi eleito deputado
federal. Seu pai, Aluízio, tinha sido cassado. O meu pai, Garibaldi, e o meu outro
tio, Agnelo, também. A cassação deles se deu em apenas dois meses
SUPERPAUTA – Como chefe da
Casa Civil do então prefeito Agnelo, você enfrentou alguma dificuldade quando
ele foi cassado?
GARIBALDI – Passei um
grande susto. Aquela cassação é um dos episódios que deixam o regime militar em
má situação. Além do autoritarismo em si, o que aconteceu com Agnelo, meu pai e
Aluízio foi um ato de mesquinharia, uma perseguição protagonizada por um general.
Depois que Agnelo foi afastado, recebi uma intimação para depor no Batalhão de
Engenharia ou no Quartel General da cidade, não lembro bem. Com a cassação do
meu pai e dos meus tios, eu e Henrique fomos às ruas disputar as eleições para
manter a oposição viva.
SUPERPAUTA – Daí a eleição
para deputado estadual e a formação do grupo oposicionista apelidado de “Jardim
de Infância”...
GARIBALDI – Sim. Acho que
o próprio governador Cortez Pereira foi quem valorizou a atuação dessa bancada,
que era bastante inexperiente. Por exemplo: completamente diferente do que
existe hoje, Cortez costumava ir pessoalmente debater na Assembleia quando era
acusado pela oposição. Ele não se limitava a fazer aquela prestação de contas
anual, a ler a mensagem governamental. Lembro muito bem de um desses debates...
Deixe-me abrir um parêntese para dizer que sempre fui vítima da miopia. As
meninas às vezes nem queriam namorar comigo porque eu usava uns óculos com aquela
armação de tartaruga e uma lente imensa e pesada. Eu já era feio, com os óculos
ficava ainda mais (risos). Mas, voltando ao episódio da Assembleia, comecei a
fazer acusações e questionamentos a respeito do governo de Cortez Pereira. Eu
disse a ele que, lamentavelmente, estava enxergando várias irregularidades no
seu governo. Quando concluí, Cortez respondeu: “olhe, você precisa ter cuidado,
porque isso pode ser efeito da sua miopia” (risos).
SUPERPAUTA – Hoje em dia
os óculos ainda provocam algum desconforto?
GARIBALDI – Comecei a
usá-los com apenas dez anos de idade. Por causa do problema na visão, fiz
uma
viagem até Recife. Fui me submeter a uma consulta e retornei de óculos. Essa
viagem foi uma grande descoberta. Foi ótimo conhecer Recife, uma cidade bem
maior. Mas, recentemente fiz uma operação de catarata com os médicos Marco Rey
e Alexandre Garcia. Eles disseram que minha miopia praticamente acabou e que eu
poderia trocar os óculos por lentes para ler de perto. Respondi que não, já
incorporei os óculos à minha vida e não deixarei de usá-los.
SUPERPAUTA – O senhor
cumpriu o serviço militar obrigatório? Cogitou outra carreira que não fosse a
política?
GARIBALDI - Fui
dispensado do serviço militar. Foi um sentimento misto de decepção e de alívio.
Na
verdade eu não me via muito integrado àquele espírito militar. Quanto a
exercer outra profissão, pensei em ser médico. Foi por influência do meu tio Quinho
Chaves. Ele é psiquiatra e professor da Universidade. O problema é que sempre
tive medo de sangue. Como isso me impedia de ser médico, cheguei a pensar em
abraçar a psiquiatria. Mas não durou muito tempo. Essa ideia foi suplantada
pela influência da vocação política da minha família. Além do meu pai, meu tio
Aluízio Alves foi um grande ídolo.
SUPERPAUTA - Como surgiu a
sua paixão pelo ABC Futebol Clube?
GARIBALDI – Também por
causa da família. Quando o assunto é futebol, Henrique perde de longe, já que a
nossa família tem mais abecedistas do que americanos. Henrique é um dos poucos
americanos mais fanáticos. O resto da tropa é toda abecedista. Tornei-me um
aficcionado ainda na época do estádio Juvenal Lamartine. Meu pai não ia muito
ao estádio. Como ele - nesse tempo - era diretor da Rádio Nordeste,
quando não podia
ir pedia ao comentarista e locutor esportivo Aluizio Menezes para me levar. Vi muito
ABC e América no Juvenal Lamartine. Ainda hoje sinto grande nostalgia quando,
da janela do apartamento onde mora o meu filho Walter Alves, vejo o velho
estádio do Tirol. Recordo daquele espetáculo que as torcidas de ABC e América
faziam com sua vibração. É triste quando hoje vejo aquele estádio vazio e
abandonado. Mas acho que devemos voltar à política. Você vai me perdoar, mas é
impossível que a política não seja o leito natural de onde deságuam essas
minhas recordações. Ela termina sendo o fio condutor dessa conversa.
SUPERPAUTA – Sendo assim,
vamos voltar ao seu período como deputado estadual.
GARIBALDI – Fui deputado por
quatro mandatos, mas acredito que não caberia nesta entrevista eu falar daquilo
que já se encontra nos anais da Assembleia ou que constou no noticiário da
época. Acho que vale a pena dizer que, apesar de eu ter passado mais tempo como
deputado, as pessoas contemplam mais a minha
atividade política da fase de
governador. Passei, na Assembleia, quase o tempo que já estou no Senado. Mas essa atividade no legislativo potiguar terminou menos relevante, em virtude da hierarquia política. Sei que muita gente não valoriza a minha passagem por lá, por isso fiz questão de acentuar aqueles debates que travei com o governador Cortez Pereira que, para mim, foram um grande momento. Lógico que participei de vários outros debates no Senado. Tive a oportunidade de presidir e dirigir os trabalhos da mais alta Casa do Legislativo brasileiro. Mas os debates na Assembleia nunca saíram da minha memória. Ao legislativo potiguar devo grande parte da experiência na minha formação política.
SUPERPAUTA – Hoje, o seu
filho Walter repete os seus passos como deputado estadual.
GARIBALDI – Sim. E quando
vejo que Walter, claro, pensa em guindar outros postos na política, eu sinto
necessidade de dizer a ele da importância que é a tarefa de legislar no próprio
estado, mesmo que o trabalho de um legislador não seja fácil. Em todo o Brasil,
a função de legislar foi muito subtraída pelo Executivo – basta ver as medidas
provisórias – e pelo Judiciário, que está cada vez mais ativo na vida política
nacional. Na minha época como deputado não era diferente. Por isso eu sempre
valorizei o debate parlamentar. Acho até que esse debate empobreceu muito no
que diz respeito ao Plenário. E tanto faz o Plenário do Senado como o da
Assembleia, o da Câmara Municipal ou da Câmara Federal. Nas comissões é que
ainda se consegue discutir alguma coisa. Mas creio que há uma crise muito
grande nesse sistema representativo. O povo não se sente mais representado por
quem está lhe representando.
SUPERPAUTA – Por que?
GARIBALDI – É bom falar
sobre esse assunto, porque ele precisa ser desmistificado. Com a evolução da
democracia direta para o modelo que nós temos hoje, o cidadão ficou cada vez
mais distante do seu representante. Há algum tempo ele se sentia traído porque não
tinha ideia do que o parlamentar estava fazendo. Agora, ocorre um fenômeno
contrário: o eleitor sabe tudo o que o parlamentar está fazendo, e quando vê que
o seu representante não está fazendo ou está fazendo errado, ele fica cada vez
mais revoltado.
SUPERPAUTA – Depois de
tantos anos de experiência, o senhor teria como responder se prefere trabalhar
no Executivo ou no Legislativo?
GARIBALDI - Eu me sinto
bem nos dois. Não há como estabelecer uma competição, quanto a isso.
Posso não
ser tão humilde quanto apregoam as pessoas, mas tenho horror de ser pretensioso.
Porém, não posso negar a verdade: da mesma forma que ocupei muitos cargos no
Legislativo (fui presidente do Senado e tive atuação destacada na Assembleia)
também trilhei um importante caminho no Executivo (fui o primeiro prefeito
eleito de Natal após o regime militar, governei o Rio Grande do Norte por dois
mandatos e agora sou ministro da Previdência Social). Realmente é difícil
optar, até porque eu me senti realizado nos dois lados. Se eu não tivesse sido
feliz, eu poderia dizer “eu era feliz e não sabia” quando estava no Legislativo
ou quando estava no Executivo. Mas não há como.
SUPERPAUTA – Como foi ocupar
a prefeitura de Natal depois de quatro mandatos como deputado?
GARIBALDI – Como disse, fui
o primeiro prefeito eleito após vinte anos de prefeitos nomeados. Essa experiência
me trouxe muitas alegrias, mas também algumas amarguras, diante da cobrança que
houve. As alegrias já são conhecidas, mas as amarguras não, e é preciso que eu
diga. Na campanha, meus adversários falavam que eu não tinha experiência. Eles
tinham um pouco de razão, porque realmente me faltava alguma tarimba. Tive que
sofrer no exercício do cargo para poder fazer uma boa gestão. No começo cheguei
a ficar um pouco depressivo. Vou contar um episódio que talvez nem meu pai
lembre. No auge de uma aflição minha como prefeito, desabafei com o meu pai em
sua casa, na Ciro Monteiro. Eu disse que estava desanimado diante de tantas
cobranças. As pessoas vinham exigir da prefeitura a solução para inúmeros
problemas que vinham se acumulando ao longo dos anos e que as administrações
anteriores não haviam resolvido. Com a volta da democracia, o povo voltou a
exigir os seus direitos. Depois que fiz esse desabafo, meu pai respondeu: “filho,
eu me abstive de exercer uma participação maior quando do seu processo de
decisão a respeito de aceitar ou não ser candidato a prefeito. Mas, agora que
você resolveu e foi eleito, trate de exercer o seu mandato da melhor maneira
possível”. Aprendi aquela lição. Hoje, quando se cogita a candidatura do meu
filho – e é bom deixar claro que isso não passa de cogitação – eu lembro muito
desse episódio.
SUPERPAUTA – Superado esse
início difícil, sua gestão foi aprovada pela população.
GARIBALDI – Na prefeitura
eu tive que lutar contra o tempo. Era um mandato muito curto e eu tinha
consciência de que ali estava o ponto da minha catapulta. Eu tinha que sair
dali vitorioso. Era aquela história: vencer ou vencer. Isso me deu um estímulo
muito grande. Além disso, eu não podia decepcionar a confiança que a população
tinha me dado. E ainda tinha que levar em conta todo aquele processo histórico:
depois de muito tempo a população estava diante de um prefeito que naquela hora
representava realmente a sua aspiração. Por tudo isso, foi muito simbólica e
histórica essa minha passagem pela prefeitura. Foram apenas três anos, mas
parece que durou tanto tempo quanto o que passei em outros cargos públicos que
exerci.
SUPERPAUTA – A experiência
no Senado foi muito diferente dos cargos que o senhor já tinha ocupado até
então?
GARIBALDI – Antigamente
diziam que o político tinha que antes governar o seu estado para poder
pleitear
uma vaga no Senado. Por conta da minha experiência vitoriosa na prefeitura de
Natal, terminei sendo eleito sem precisar passar pelo governo do estado. Quando
saí da prefeitura, permaneci quase dois anos sem mandato, até disputar a vaga
de senador. Acho que teria chegado com mais confiança ao Senado se antes
tivesse passado pelo cargo de governador. De qualquer forma, ao chegar ao
Senado encarei um desafio grande, mas gratificante: o de presidir uma comissão
parlamentar de inquérito (CPI) que apurou desvios na aplicação do FGTS. Essa
CPI teve um cunho dramático porque durante a apuração das irregularidades houve
o assassinato do governador Edmundo Pinto, do Acre. O crime ocorreu menos de 48
horas antes de ele depor na CPI. Ele foi morto a tiros em um hotel da capital
paulista. Depois disso, tive uma aparente emoção, um sentimento de
responsabilidade maior, quando fui escolhido vice-líder da bancada do PMDB. Eu era
um dos mais novos senadores. Porém, passado algum tempo, verifiquei que eram
vários vice-líderes. O fato de eu ter sido escolhido não merecia a dimensão que
eu atribuí, na época.
SUPERPAUTA – Depois do
Senado, o senhor foi eleito governador do Rio Grande do Norte.
GARIBALDI – Fui convocado
para disputar o governo do estado. No Senado daquele tempo, encontrei grandes
parlamentares como Jarbas Passarinho e Paulo Brossard, entre outros. Porém,
infelizmente os
grandes debates tinham deixado de ocorrer no Plenário e se
transferido para as comissões. Na tribuna do Plenário os senadores se revezavam
mais em função da TV Senado. Os discursos não eram feitos para debater com os
pares os grandes problemas nacionais, mas para prestar contas aos eleitores-telespectadores.
Mas, quando fui eleito governador, já não me deparei com as mesmas dificuldades
que tive como prefeito. Minha desenvoltura foi outra. Tive dificuldades, claro,
e sofri em alguns momentos pela falta de capacidade de investimento do Estado. Mas,
desde o princípio - diante da necessidade de prestar contas à população –
passamos a divulgar mensalmente a economia feita em setores não essenciais do
governo e onde o dinheiro público estava sendo investido. Essa “poupança”
representava justamente o cuidado que a gente tinha de mostrar ao povo que o
governo não tinha se rendido às dificuldades, e estava trabalhando. Não é fácil
um governo apresentar resultados sem capacidade de investimento. Às vezes é
necessário até um verdadeiro exercício de mágica. Muitos atribuem o programa
das adutoras à privatização da Cosern. Isso é verdade. Mas é preciso lembrar
que antes da privatização foi realizado um esforço muito grande para tornar a
Cosern atraente aos investidores. Do contrário, o valor apurado teria sido
muito baixo. É certo também que o programa das adutoras começou antes disso.
SUPERPAUTA – Qual teria
sido o “abacaxi” maior? O Ministério da Previdência Social ou assumir a
Presidência do Senado em um momento de crise da instituição?
GARIBALDI – Asseguro que
nenhuma dessas ocasiões se revelou com maior dramaticidade do que lá
atrás,
quando assumi a prefeitura de Natal. Quando fui escolhido para assumir a
Presidência do Senado, eu já tinha sido eleito governador duas vezes. Por outro
lado, tinha acabado de ser derrotado em uma eleição pela primeira vez, quando
disputei novamente o governo do estado. O que me impressionou durante aquela
crise foi que de repente as pessoas passaram a ver no meu nome uma solução. Talvez
isso tenha ocorrido pelo meu perfil conciliador. Como prefeito, passei três
anos; como presidente do Senado, permaneci apenas um ano e dois meses. Foram
experiências – claro - diferentes, mas duras. Só que no Legislativo há uma
divisão de responsabilidades muito maior do que no Executivo. O meu êxito se
deve à compreensão que todos tinham naquele momento dramático. Era consenso que
o Poder Legislativo tinha que sair daquela crise. Eu estava no centro do
furacão - como se diz popularmente - mas protegido pela solidariedade de todos.
SUPERPAUTA – E no caso do
Ministério da Previdência?
GARIBALDI – A experiência
é bem diferente. Eu diria que algumas vezes há uma falta de compreensão por
parte da gerência do governo com o próprio governo. É diferente de uma Casa
Legislativa. Felizmente, hoje posso dizer que tenho ao meu favor a
solidariedade do governo e sempre contei com o apoio da
presidenta Dilma
Rousseff. O trabalho no Ministério está indo bem graças a uma pequena equipe
que trouxe para ocupar postos estratégicos e, sobretudo, ao excelente quadro
administrativo da Previdência e do INSS. Há na administração da Previdência
muito profissionalismo. Tem muita gente comprometida com a eficiência, e são os
próprios servidores da Casa que vêm dando essa contribuição ao longo dos anos.
Talvez eu tenha cometido uma injustiça quando disse que era um abacaxi. Aquela
época das filas intermináveis acabou. A Previdência melhorou e vem procurando
aperfeiçoar cada vez mais o atendimento que oferece aos seus segurados.
SUPERPAUTA – Quando alguém
fala em Previdência, invariavelmente se lembra do déficit.
GARIBALDI – É verdade,
mas esse déficit precisa ser desmistificado, e tem sido. A previdência urbana é
superavitária. O déficit existe na previdência rural, que não é contributiva.
Quanto às aposentadorias e pensões dos servidores públicos, conseguimos obter
um grande êxito com a aprovação do regime de previdência complementar para os
servidores públicos federais e a fixação de um teto igual à previdência geral
para a concessão de aposentadorias e pensões. Da forma que era antes, não podia
continuar. O déficit era gigantesco e comprometia a própria sustentabilidade do
sistema. Em 2012, o déficit da previdência de 1,1 milhão de servidores públicos
inativos chegou a 57 bilhões de reais, contra um déficit de 42 bilhões da
previdência geral, que pagou mensalmente 30 milhões de aposentadorias e
pensões. A criação da Fundação de Previdência Complementar do Servidor Público
(Funpresp) foi um passo concreto para viabilizar o sonho de ver a Previdência
melhorar. Sei que esse sonho não vai se realizar de um dia para outro, teremos
que aguardar muitos anos.
SUPERPAUTA – Fale um pouco
sobre a sua família.
GARIBALDI - A minha
família está presente na história política do Rio Grande do Norte. Eu não sei
se o que você está pedindo é que eu fale sobre isso...
SUPERPAUTA – Fale sobre a esposa
e os filhos.
GARIBALDI – Ah, a minha
família pequena... A minha mulher, Denise, nunca gostou de política. Mas,
quando nos casamos, eu já era deputado estadual. No começo do namoro eu já era deputado.
Ela é uma mulher muito compreensiva. Tanto é que hoje, além de esposa de um
político, ela é mãe de outro. Costumo brincar com Denise dizendo que para mim
ela nunca fez campanha, mas quando Walter entrou na política, ela passou a
pedir votos para ele de casa em casa. Denise ri muito com isso. Ela é uma
mulher muito sensível e é a responsável pela harmonia da nossa família. Quanto
aos filhos, eu tenho dois. Um deles é mais ajuizado, puxou à mãe: Bruno, que
optou por ser empresário. O outro não tem juízo: Walter, que é deputado
estadual. Brincadeiras a parte, os dois são bem sucedidos e estão se saindo
bem. Mas, atualmente, a figura central da família é o neto, Dudu, o Luiz
Eduardo. Ele tem apenas três anos e alguns meses, mas já manda na família.
SUPERPAUTA – Mande um
recado para o leitor.
GARIBALDI – Quando eu
deixar a vida pública, daqui a alguns anos, espero voltar a ser visto como um
cidadão comum, mas que deu uma importante contribuição ao seu estado e à sua
cidade. A pior coisa do mundo deve ser você, ao concluir um trabalho, pedir às
pessoas que o esqueçam. Eu quero o contrário: peço que lembrem de mim e
entendam que procurei fazer sempre, da melhor maneira possível, o que estava ao
meu alcance. Me sinto como estes versos de Carlos Drummond de Andrade: “Tenho apenas
duas mãos e o sentimento do mundo”. Como político sempre busquei extrapolar os
meus limites na tentativa de trabalhar pelos que mais precisam. Estou nessa
vida há bastante tempo e esse “sentimento do mundo”, essa vontade de ajudar,
não se afastou de mim. Pena que eu tenha apenas duas mãos...
Já é o início de uma biografia! Autorizada, claro!
ResponderExcluirSenador, a proposta de Pituleira está de pé: como ninguém quer assumir o Governo do RN - por causa dos abacaxis com os servidores, briga entre poderes, falta de investimentos e atrasos salariais - ele topa o sacrifício de ser o candidato... com o seu apoio, claro! Parabéns pela entrevista.
ResponderExcluirEntre uma e outra passagem com o ministro Garibaldi, lembro um dia já terminando de almoçar no restaurante do Ministério da Previdência, o ministro chega segurando o bandejão a procurar uma mesa para sentar-se; nisso eu e outros colegas de trabalho nos levantamos e oferecemos o lugar, ao tempo em que ele me agradece e fizemos rápidos comentários, para surpresa dos companheiros, onde uma colega virou-se pra mim e disse “com um amigo desse eu não pensaria ser apenas um mero servidor público”, e rimos muito. Grande Garibaldi! Grande entrevista!
ResponderExcluirHá uma característica em comum nos melhores profissionais que conheci, todos fizeram de seu trabalho uma arte.
ResponderExcluirGrande Roberto Homem!
Parabéns, Roberto. A você e ao ministro Garibaldi. Você, mais uma vez, demonstra o grande talento profissional de que é possuidor; e o Ministro, com a humildade de sempre, deixa explicitada sua indiscutível capacidade de atrair o respeito de todos pela franqueza com que responde a todas as perguntas.
ResponderExcluirMuito boa a entrevista de Garibaldi, essa história da praia em Mãe Luiza, alem de salvar a vida da familia, salvou a carreira politica de Garibaldi, era 1990, ele lutava pra ser eleito senador pela primeira vez. Disputou com Carlos Alberto, que tentava a reeleição...ganhou dele por 70 mil votos...maioria conseguida no interior, porque na capital, a luta entre os dois foi bastante renhida. Carlos Alberto ainda ficou uns dois meses sem fazer campanha, estava impedido, com registro tramitando no TRE...
ResponderExcluirSensacional entrevista. Tive acesso em primeira mão, além de ter ajudado na edição!
ResponderExcluirMarcos Lacerda Almeida Filho (Via Facebook)
Vida longa ao Superpauta, Roberto!
ResponderExcluirAbraços,
Zema Ribeiro
Ótima!!! Beleza de entrevista, mas tenho certeza que foi tudo por causa da colaboração do Deputado Marquinhos.....KKKKK
ResponderExcluirAbraços,
Lindolfo (via Gmail)
Tá bacana. A cara do Gari. Não se esqueça que o Magela continua aguardando a vez. Abraços
ResponderExcluirChiquinho
Bob,
ResponderExcluirO Zona Sul se acaba com a chegada do Superpauta?
Muito boa a entrevista.
Roberto Fontes (Via Gmail)
Excelente entrevista e ao mesmo diferente das muitas que o Ministro concedeu. O lado humano, as brincadeiras de criança, no futebol, nunca imaginava ele sendo zagueiro. Assim como a frequência às belas praias de Natal, a sua paixão pelo ABC. Enfim, um lado que poucos, com certeza, conheciam. Parabéns, Roberto. Bela estreia.
ResponderExcluirCosta Júnior (Via Gmail)