quarta-feira, 29 de outubro de 2025

Encontros Impossíveis – Chico Xavier

 Encontros Impossíveis

O sopro da luz


Entre o mistério e a ternura, a criatividade e a inteligência artificial, ele retorna com a mesma voz mansa que consolou milhões e mantém esta ‘conversa’ imaginária com o SuperPauta sobre vida, morte e o amor que atravessa fronteiras


“A vida não termina com a morte. Ela apenas muda de estação.” — Chico Xavier

 

Quando o amor se recusa a morrer, ele encontra caminhos para atravessar fronteiras que a razão não compreende. Aqui, no jornalismo do impossível, a conversa segue — mesmo para além da vida. A névoa não assusta. É macia, luminosa, quase viva. Há cheiro de papel e incenso, de prece e madrugada. À minha frente, uma mesa simples de madeira rústica. Um caderno aberto. Um lápis apontado com cuidado. Chico Xavier não surge — ele se insinua, com a delicadeza dos que sabem chegar sem ruído. Olhos baixos, sorriso tímido, o gesto sereno de quem aprendeu que a fé é mais forte que o medo. Ele me oferece uma cadeira como quem oferece refúgio. Assim começa a conversa — não entre um vivo e um morto, mas entre duas saudades tentando se entender.

 

No novo capítulo dos Encontros Impossíveis, Chico Xavier fala sobre infância, mediunidade, humor, fé, desigualdade, redes sociais, meio ambiente e o que realmente importa quando a vida muda de estação. Em tom simples e cheio de ternura, o médium mineiro revela sua visão sobre o Brasil, a juventude e o futuro do planeta — e deixa uma última imagem de humildade e esperança. (Roberto Homem)

 


 

SuperPauta: Chico, dá pra contar como era sua infância lá em Pedro Leopoldo?

Chico Xavier: (pensativo) Meu irmão… a infância foi um tear de lutas com fio de bênçãos, graças a Deus. Pedro Leopoldo era chão de terra batida, cheirinho de pão no forno e de café coado na hora. A gente tinha pouco no bolso, mas havia fartura de afeto — vizinho era parente de porta, e o quintal, sala de aula. Estudei pouco, trabalhei cedo; criança ainda, eu já ajudava em tudo que aparecia. A vida ensinou na prática: a fome alfabetizou o coração, e o trabalho ensinou a somar coragem. Houve dureza, sim. A disciplina de casa era firme — firme até demais (sorri, lembrando). Mas veja: a dor foi professora exigente, me botou de castigo pra eu aprender compaixão. Mais tarde entendi — quem apanha da vida aprende a não bater nos outros. Tínhamos Evangelho simples, prece curta, lamparina acesa. “Tudo passa”, eu repetia baixinho… e passava mesmo. E quando não passava, a gente passava por dentro — com paciência e fé.

 

SuperPauta: Quando o senhor fala de Pedro Leopoldo, parece que volta lá em pensamento… Que outras lembranças o senhor guarda daquela terra e daquela infância simples que tanto contribuíram na sua formação?

Chico Xavier: (olhos semicerrados, voz saudosa) Eu me lembro do barulho do vento nos beirais… do sino chamando pra reza… do cheiro da chuva chegando. Pedro Leopoldo foi minha primeira escola: ali descobri que pobreza não é defeito, é lição; que alegria não depende de carteira cheia, mas de coração agradecido; e que Deus mora é no cotidiano — na caneca dividida, na palavra de consolo, no pão repartido ao meio. Se hoje eu sei ouvir dor de gente, devo àquele começo: a vida me adestrou o coração pra servir, meu irmão.

 

SuperPauta: Quando foi a primeira vez que o senhor “viu” algo do outro lado?

Chico Xavier: (sorri de leve) Ah, meu filho… eu era pequenino, uns quatro, cinco anos no máximo. A casa silenciosa, fim de tarde, lamparina fazendo aquele círculo de luz mansa. A saudade da minha mãezinha apertava como se a alma fosse menor que o peito. Foi então que senti um perfume distinto, doce — não de flor da horta, mas um cheiro que abraçava. Olhei e vi: minha mãe. De presença tão serena que o medo nem teve tempo de chegar. Não era assombro — era ternura. Ela me falou com voz de colo: “Meu filho, não chore. A vida continua. Mamãe não te deixou, apenas mudou de lugar.” E eu, menino, entendi sem entender — o coração compreendeu primeiro que a cabeça.

 

SuperPauta: E como foi, Chico, perceber que aquele primeiro encontro com sua mãe não era só uma lembrança, mas o início de uma missão? Como o senhor entendeu que a mediunidade seria essa ponte entre dois mundos?

Chico Xavier: Não houve espetáculo, não houve barulho — houve paz. E paz é assinatura do céu. Depois daquele dia, outras presenças vieram, como quem bate à porta com respeito. Às vezes, uma palavra dentro do pensamento. Às vezes, uma luzinha por trás dos olhos. Às vezes, um impulso de fazer o bem sem perguntar por quê. Fui crescendo e vendo que o mundo de Deus é maior que a parede dos nossos sentidos. Mais tarde, com estudo e disciplina — disciplina, disciplina e disciplina — percebi que mediunidade é ponte. E ponte não se constrói pra ser admirada, mas pra ser atravessada. A primeira visita da minha mãe me ensinou isso: o amor não termina no cemitério; ele só troca de endereço. Desde então, quando a saudade doía, eu lembrava da voz dela: “Meu filho, a vida continua.” E continua mesmo, graças a Deus.

 

SuperPauta: E como o espiritismo entrou na sua vida?

Chico Xavier: (olha pro repórter com os olhos úmidos, fala baixinho) Ah… meu irmão… O espiritismo chegou até mim do mesmo jeito que as grandes lições da vida costumam chegar: pela dor. Foi lá pros idos de 1927. Uma das minhas irmãs adoeceu de repente, muito aflita, atormentada por forças que ninguém sabia explicar. Era dia e noite de sofrimento. A gente orava, chamava médico, mas o alívio não vinha. E eu, moço ainda, sentia uma angústia grande… aquele aperto no peito de quem quer ajudar e não sabe como. (pausa longa) Aí, um amigo, o senhor José Hermínio Perácio, homem de fé boa, me disse: “Chico, leva sua irmã pra casa da gente. Vamos cuidar dela com o amparo do Evangelho.” E assim foi. Fomos pra Fazenda Maquiné, lá perto de Curvelo. Lá, ele e dona Carmem, sua esposa — mulher de oração firme e mãos serenas — começaram o tratamento espiritual. As preces se multiplicaram, a ambiência se encheu de perfume de flor, e o que parecia impossível começou a mudar. Durante uma reunião, minha mãezinha — que já havia partido há anos — se manifestou.

 

SuperPauta: E foi nesse momento, Chico, ouvindo novamente a voz da sua mãe, que o senhor percebeu que aquele encontro não era apenas consolo, mas um chamado? Que havia ali o início de uma missão maior?

Chico Xavier: A voz dela… (emocionado) era como o abraço que a gente sente mesmo sem tocar. Ela nos falou com tanta ternura, tanta paz, que até o medo se ajoelhou dentro da gente. Naquele instante, eu entendi. Entendi que Deus tinha me levado ali não pra ver um milagre, mas pra aprender um caminho. Minha irmã se restabeleceu, graças a Deus, e eu saí de lá com o coração em reforma. Passei a estudar, estudar muito, junto de alguns amigos. Fundamos um pequeno grupo pra ler o Evangelho, conversar, aprender — e foi nessas reuniões, humildes mas cheias de amor, que a mediunidade começou a se abrir em mim. A primeira vez que psicografei, parecia que o tempo tinha parado. A mão escrevia, e o coração chorava de alegria. A partir dali, nunca mais duvidei. (olha pro alto, com sorriso singelo) A dor, meu irmão, foi a professora que me matriculou no espiritismo… e eu fiquei até hoje estudando. (risos suaves)

 

SuperPauta: A mediunidade foi fácil de aceitar?

Chico Xavier: De jeito nenhum, meu filho! (risos) Fácil não foi, não. No começo, eu só queria ser um menino comum, brincar de bola de gude, soltar pipa, estudar direitinho, trabalhar, casar... essas coisas que todo mundo sonha. Mas Deus tinha outros planos. Quando começaram as visões, as vozes, as presenças, confesso que fiquei apavorado. Era muito novo, e aquilo me parecia mais um castigo do que uma bênção. Tinha noite que eu cobria a cabeça com o lençol, achando que o escuro ia esconder os espíritos — como se espírito precisasse de luz pra enxergar (risos). Muitas vezes chorei escondido, pedindo pra ser “normal”. Mas, com o tempo, fui entendendo que normal mesmo é servir. Cada um tem a sua tarefa na vinha de Deus: uns plantam, outros colhem, outros consolam. E mediunidade, meu irmão... é serviço. Nunca privilégio! Não é medalha pra exibir, é ferramenta pra trabalhar. O médium é como o fio que conduz a corrente elétrica: se estiver enferrujado pelo orgulho ou pela vaidade, a luz não passa. Precisa limpar o coração todo dia pra continuar sendo canal do bem.

 

SuperPauta: Como foi o encontro com Emmanuel?

Chico Xavier: (olhar sereno, tom de respeito) Ah, Emmanuel… Foi meu grande orientador, um amigo de outras vidas, um professor paciente e exigente. Ele apareceu certa noite, quando eu ainda duvidava da minha própria tarefa. Não chegou com clarins nem luzes, chegou com silêncio. E me disse com voz firme: “Meu filho, aceita o compromisso, mas lembra-te: disciplina, disciplina e disciplina.” (pausa breve) Não era um mentor de afagos, não… era de vigilância. Quando eu me queixava das dificuldades, ele respondia: “Se você não pode sofrer por amor, sofra por obrigação — que o aprendizado vem do mesmo jeito.” (ri discretamente)

E não é que vem mesmo? Com o tempo, entendi: o dom sem disciplina vira brinquedo perigoso. A mediunidade é empréstimo divino — Deus confia à gente um pouquinho da tarefa d’Ele, pra ver se a gente aprende a amar servindo. E Emmanuel me ensinou isso com paciência de mestre. Hoje eu digo: não fui eu que escolhi o caminho. Foi o caminho que me escolheu — e eu aceitei, graças a Deus.

 

SuperPauta: E como é a sensação de psicografar?

Chico Xavier: (olha pro papel imaginário, como se visse o lápis se mover)

Ah, meu irmão… é difícil colocar em palavras o que é maior que a palavra. A psicografia, pra mim, sempre foi como um convite de Deus pra rezar com a mão. A gente se prepara, faz uma prece, se aquieta por dentro, e de repente parece que o pensamento vai ficando limpinho, como um rio quando a lama assenta. A mente silencia, o coração se acende — e a alma entra num estado de oração que não precisa de fala. É um momento de grande doçura. Às vezes, vinha um perfume suave, cheiro de flores que não estavam ali — flor que o espírito trazia, eu acho. Outras vezes, era uma paz tão profunda que o tempo parecia se derreter, desaparecer. Eu já não sentia o peso da mão, nem o som do ambiente. Era como se o lápis escrevesse sozinho, mas com carinho, sem pressa.

 

SuperPauta: E quando a mensagem termina, Chico… o que fica dentro do senhor? É cansaço, alívio, emoção? O que passa no coração de quem acaba de servir de ponte entre dois mundos?

Chico Xavier: (voz baixa, emocionada) Fica uma ternura mansa… Uma vontade de chorar sem tristeza. Parece que a alma tomou banho de luz. Em certos momentos, dava vontade de agradecer aos espíritos pela confiança. Eu sabia: não era o autor, era apenas o carteiro. E carteiro bom não lê a carta — só entrega, com respeito. Mas é preciso cuidado, meu filho. Se o orgulho entra, bagunça tudo. O segredo é humildade e estudo. O médium precisa vigiar o pensamento como quem cuida de uma chama. A vaidade é vento que apaga a luz. Quando a gente compreende isso, a psicografia deixa de ser fenômeno e vira oração viva — oração que se move no papel, graças a Deus.

 

SuperPauta: E os livros? Como surgiam tantos?

Chico Xavier: (risos leves) Meu filho, eu nunca escrevi nada sozinho. Era instrumento, apenas isso. Os livros vinham como chuva de mensagem boa. Romances, cartas, poemas, consolos de mãe pra filho, de filho pra mãe… Tudo com o mesmo propósito: consolar. Consolar é mais bonito que convencer. O papel do médium é ser ponte, não autor. Quem escreve é o espírito. Quem lê é o homem. E quem se alivia é a alma.

 

SuperPauta: E o senhor nunca ficou com o dinheiro?

Chico Xavier: De jeito nenhum! (sorri) O que vem de Deus volta pra Deus. Desde o primeiro livro, tudo foi destinado à caridade. Eu dizia: “Quem escreve é o espírito, quem lê é o homem, e quem recebe é o necessitado.” Dinheiro não compra paz, meu irmão. A única moeda que vale no além é o bem repartido.

 

SuperPauta: O senhor sempre trabalhou, mesmo psicografando tanto?

Chico Xavier: (ri baixinho) Trabalhei, sim, meu filho — a vida toda, graças a Deus. Mais de quarenta anos no Ministério da Agricultura. Batendo ponto, pegando ônibus, enfrentando sol e enchente. E, claro, levando marmita embrulhada num pano (risos). De dia, carimbo e relatório. À noite, oração e papel. O trabalho é oração de pé. Quando a gente cumpre o dever com boa vontade, o expediente vira prece.

 

SuperPauta: Nunca pensou em parar um pouco, em descansar? De onde vinha tanta força pra servir sem esmorecer?

Chico Xavier: (pausa longa) Tinha dia que o corpo reclamava — e com razão. Mas a alegria de servir aliviava o peso. Porque quando a gente serve com amor, o cansaço muda de nome: vira gratidão. Eu sempre dizia: “A gente descansa servindo.” E é verdade. Servir é o repouso do espírito. Ajudar o outro é o jeito mais bonito de cuidar da própria alma. O Ministério me ensinou disciplina. A mediunidade, paciência. Um completava o outro, como o pão e o café da manhã. E quando eu fechava o escritório e abria o centro, era como trocar de tarefa, não de missão. No fim das contas, a ordem era a mesma:  trabalhar com amor e deixar Deus assinar o relatório. (sorri)

 

SuperPauta: E quando batia o cansaço?

Chico Xavier: Ah, meu filho, tinha noite que o corpo pedia cama e a alma pedia paciência. Aí eu rezava e pensava: “Tudo passa.” E passa mesmo. Até a dor é visita: chega, ensina e vai embora.

 

SuperPauta: Chico, no programa Pinga-Fogo, exibido pela antiga TV Tupi em 1971, o senhor contou uma história do avião que fez todo mundo rir. O senhor pode relembrar como foi essa experiência?

Chico Xavier: (risos)

Ah, essa história… foi em 1959. Eu já morava em Uberaba e estava indo pra Belo Horizonte de avião. Tudo tranquilo até a escala em Araxá. Mas depois da decolagem… o aparelho começou a dançar! Pra um lado, pro outro — parecia mais sanfoneiro que avião. As senhoras agarraram o rosário, os homens fecharam os olhos, e eu… (risos) eu orava baixinho, tentando mostrar calma, mas tremia mais que o motor. De repente, ouvi o comandante dizendo: “Não se preocupem, é só vento de cauda.” Mas, meu filho, quem tá entre o céu e a terra não quer saber de vento — quer saber é de anjo! Foi então que Emmanuel, meu guia, falou dentro de mim: “Você não acha melhor calar-se e dar testemunho da fé?” E eu, desesperado: “Mas, Emmanuel, é a morte! Estamos apavorados!” E ele: “Se vai morrer, morra com educação — sem gritar, pra não assustar os outros.” (ri com gosto) E eu me calei. O avião se estabilizou. O padre terminou o terço, e eu agradeci em silêncio. Naquele dia aprendi duas coisas: que a fé também tem humor, e que morrer com educação é lição de espírito evoluído! (risos)

 

SuperPauta: Que conselho o senhor dá pra quem perdeu alguém querido?

Chico Xavier: (olhar manso, voz baixa) Meu irmão… ninguém morre. O corpo é só a roupa que a alma deixa no varal.  O amor continua, firme, invisível — mas continua. A saudade é o amor que ficou pra nos ensinar paciência. Ela dói, sim. Às vezes parece que a ausência é maior que o mundo. Mas quando a gente se recolhe em oração e chama aquele nome com ternura, a vibração chega lá. Já recebi tantas cartas de mães, pais, filhos, cada um com a mesma dor, com a mesma pergunta: “Chico, ele ainda me ouve?” E eu respondia: ouve, sim. O pensamento é o telefone do espírito. Quando é discado com amor, a ligação nunca cai. Por isso eu digo: ore, converse em pensamento, faça o bem em nome de quem partiu.

Cada gesto de caridade é uma flor que se acende no caminho deles. O amor, meu filho, não tem cemitério — tem continuidade.

 

SuperPauta: E como atravessar essa saudade?

Chico Xavier: (sorri com doçura) Com oração e serviço, meu filho. A caridade é o melhor remédio pra alma doente. Quando a gente ajuda alguém, o coração que chorava começa a sorrir devagar. A dor não vai embora de um dia pro outro, mas se transforma — vira força, vira saudade mansa, saudade boa de lembrar. Quem ama de verdade não se separa nunca. Apenas muda de endereço. E Deus, na sua sabedoria, não apaga laços — ele só os alonga. O reencontro vem na hora certa, e quando acontece, a gente entende que nenhuma lágrima foi em vão.

 

SuperPauta: O Brasil será mesmo o coração do mundo?

Chico Xavier: (olhos vivos, sorriso leve) Acredito, sim, meu irmão. Mas o coração, pra pulsar direito, precisa estar saudável. E o nosso Brasil ainda está em tratamento. É um país abençoado — mistura de raças, de credos, de culturas. Aqui é a oficina onde a fraternidade está sendo testada. Cada conflito é uma lição, cada crise é uma cirurgia moral. Deus está operando o coração do Brasil. E quem ama o país precisa ajudar nesse tratamento:

com paciência, honestidade e trabalho. O Brasil é chamado a ser o exemplo do amor que acolhe, não da força que divide. O Evangelho renascerá por aqui, mas precisa da nossa boa vontade. Somos aprendizes do amor universal — e a sala de aula é essa terra imensa e bonita.

 

SuperPauta: Que recado daria à juventude de hoje?

Chico Xavier: (voz firme, doce) Meu filho, a juventude é a primavera da alma. Não deixem que o medo ou a pressa roubem esse tempo. O mundo vai tentar convencer o jovem a desistir, a acreditar que nada vale a pena, que tudo é interesse. Mas isso é engano. A alma jovem tem uma força que o tempo não apaga — a capacidade de recomeçar. Estudem, sim, mas estudem também o coração. Não se deixem levar pela vaidade do saber sem servir. Procurem fazer o bem sem alarde, com alegria. A verdadeira revolução é a da bondade. E o Brasil precisa de jovens que, antes de mudar o mundo, queiram melhorar o próprio interior. O amor, quando jovem, é semente. Quando amadurece, vira árvore de sombra larga.

 

SuperPauta: E se o senhor vivesse hoje, com internet e redes sociais?

Chico Xavier: (risos)

Ah, meu irmão, eu usaria tudo isso… mas com cuidado. A palavra, seja falada ou digitada, continua sendo semente. A gente precisa pensar antes de postar, porque a palavra é como o perfume: pode perfumar o ambiente ou envenená-lo. Se eu estivesse na internet, usaria pra espalhar consolo, alegria, esperança. Pra mandar um recado de amor pra quem anda esquecido. Mas lembraria sempre que, às vezes, o silêncio é a postagem mais bonita. O silêncio também é mensagem — é quando o coração fala e a língua descansa.

 

SuperPauta: O senhor falava muito da palavra como oração... isso muda no digital?

Chico Xavier: Não muda nada. A vibração é a mesma. A frase maldosa na tela é como pedra no coração. A prece digitada também sobe, se for sincera. Cada clique é escolha espiritual.

 

SuperPauta: Como manter a espiritualidade no mundo corrido?

Chico Xavier: Espiritualidade é gentileza no trânsito, é paciência no lar, é sorriso no cansaço. Orar é bom, mas agir é melhor. O evangelho começa no gesto, não na boca.

 

SuperPauta: E o planeta, Chico? Está doente?

Chico Xavier: (fica sério, tom de compaixão) O planeta está cansado, meu irmão. A Terra é mãe — e mãe sofre quando vê os filhos brigando. Temos explorado demais, ferido o solo, poluído o ar, esquecendo que a natureza é o corpo de Deus vestido de verde. Cada árvore cortada à toa é uma oração interrompida. Cada rio sujo é uma lágrima do planeta, mas ainda há tempo. Se cada pessoa cuidar do pequeno pedaço que pisa, o mundo inteiro se cura. O primeiro passo da ecologia é o respeito. O segundo é a gratidão. Quando a gente aprende a agradecer a água, o alimento, a sombra, já começou o tratamento espiritual do planeta. A Terra não pede nada impossível — só que a gente pare de ferir quem nos alimenta.

 

SuperPauta: A ciência um dia vai provar tudo?

Chico Xavier: (sorri com doçura e ironia) Ah, meu filho… a ciência é filha de Deus também. Mas há verdades que o microscópio não alcança. A fé não pede diploma, e a ciência, quando é humilde, reconhece o que ainda não sabe. Elas não são inimigas — são irmãs que ainda brigam por brinquedo. Um dia, ciência e fé vão caminhar de mãos dadas, porque o amor é o ponto onde todas as leis se encontram. Mas até lá, precisamos de paciência — e menos orgulho nos laboratórios e nos altares.

 

SuperPauta: O que é a morte, afinal?

Chico Xavier: (voz serena, quase um sussurro) A morte é a volta pra casa, meu irmão. O corpo fica, mas o espírito continua. É como tirar a roupa depois de um dia cansativo: a alma respira, se reconhece, entende o que aprendeu. O espírito acorda e diz: “Ah, então era isso…” Morrer não é castigo — é promoção. E quem amou de verdade não perde ninguém, só muda o horário do encontro. A morte não é fim — é intervalo. A vida é uma só, só muda de cenário. E Deus… é o mesmo diretor amoroso de sempre.

 

SuperPauta: Como se preparar pra ela?

Chico Xavier: Vivendo bem, meu filho. Vivendo com simplicidade, perdoando logo, ajudando sempre. A gente não leva bens, leva o bem. No além, ninguém pergunta o saldo — pergunta se você amou, se perdoou, se serviu. O desencarne é só mudança de estação. O trem segue. E, se fizermos a viagem com leveza, o reencontro será alegre, como quem volta pra casa depois de uma longa jornada.

 

SuperPauta: Chico, se pudesse deixar uma última imagem pro leitor...

Chico Xavier: (olha fixo, com voz mansa e sorriso terno)

Gostaria que me lembrassem como um vizinho disposto a ouvir. Um homem que passou pra deixar consolo, um sorriso, um café repartido. Tudo passa — menos o amor. E no fim, o que vale é ter vivido de modo que só se leve na bagagem a alegria de ter amado. (olha pro alto, pausa longa) A vida continua, meu filho… sempre continua.

 




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