Encontros Impossíveis
O sopro da luz
Entre o mistério e a ternura, a criatividade e a inteligência artificial, ele retorna com a mesma voz mansa que consolou milhões e mantém esta ‘conversa’ imaginária com o SuperPauta sobre vida, morte e o amor que atravessa fronteiras
“A vida não termina com a morte. Ela apenas muda de
estação.” — Chico Xavier
Quando o amor se recusa a morrer, ele encontra
caminhos para atravessar fronteiras que a razão não compreende. Aqui, no
jornalismo do impossível, a conversa segue — mesmo para além da vida. A névoa
não assusta. É macia, luminosa, quase viva. Há cheiro de papel e incenso, de
prece e madrugada. À minha frente, uma mesa simples de madeira rústica. Um
caderno aberto. Um lápis apontado com cuidado. Chico Xavier não surge — ele se
insinua, com a delicadeza dos que sabem chegar sem ruído. Olhos baixos, sorriso
tímido, o gesto sereno de quem aprendeu que a fé é mais forte que o medo. Ele
me oferece uma cadeira como quem oferece refúgio. Assim começa a conversa — não
entre um vivo e um morto, mas entre duas saudades tentando se entender.
No novo capítulo dos Encontros Impossíveis,
Chico Xavier fala sobre infância, mediunidade, humor, fé, desigualdade, redes
sociais, meio ambiente e o que realmente importa quando a vida muda de estação.
Em tom simples e cheio de ternura, o médium mineiro revela sua visão sobre o
Brasil, a juventude e o futuro do planeta — e deixa uma última imagem de
humildade e esperança. (Roberto Homem)
SuperPauta: Chico, dá
pra contar como era sua infância lá em Pedro Leopoldo?
Chico Xavier: (pensativo) Meu
irmão… a infância foi um tear de lutas com fio de bênçãos, graças a Deus. Pedro
Leopoldo era chão de terra batida, cheirinho de pão no forno e de café coado na
hora. A gente tinha pouco no bolso, mas havia fartura de afeto — vizinho era
parente de porta, e o quintal, sala de aula. Estudei pouco, trabalhei cedo;
criança ainda, eu já ajudava em tudo que aparecia. A vida ensinou na prática: a
fome alfabetizou o coração, e o trabalho ensinou a somar coragem. Houve dureza,
sim. A disciplina de casa era firme — firme até demais (sorri, lembrando). Mas
veja: a dor foi professora exigente, me botou de castigo pra eu aprender
compaixão. Mais tarde entendi — quem apanha da vida aprende a não bater nos
outros. Tínhamos Evangelho simples, prece curta, lamparina acesa. “Tudo passa”,
eu repetia baixinho… e passava mesmo. E quando não passava, a gente passava por
dentro — com paciência e fé.
SuperPauta: Quando o senhor fala de Pedro Leopoldo, parece
que volta lá em pensamento… Que outras lembranças o senhor guarda daquela terra
e daquela infância simples que tanto contribuíram na sua formação?
Chico Xavier: (olhos semicerrados, voz saudosa) Eu me lembro do
barulho do vento nos beirais… do sino chamando pra reza… do cheiro da chuva
chegando. Pedro Leopoldo foi minha primeira escola: ali descobri que pobreza
não é defeito, é lição; que alegria não depende de carteira cheia, mas de
coração agradecido; e que Deus mora é no cotidiano — na caneca dividida, na
palavra de consolo, no pão repartido ao meio. Se hoje eu sei ouvir dor de
gente, devo àquele começo: a vida me adestrou o coração pra servir, meu irmão.
SuperPauta: Quando foi a primeira vez que o senhor “viu” algo do outro lado?
Chico Xavier: (sorri de
leve) Ah, meu filho… eu era pequenino, uns quatro, cinco anos no máximo. A casa
silenciosa, fim de tarde, lamparina fazendo aquele círculo de luz mansa. A
saudade da minha mãezinha apertava como se a alma fosse menor que o peito. Foi
então que senti um perfume distinto, doce — não de flor da horta, mas um cheiro
que abraçava. Olhei e vi: minha mãe. De presença tão serena que o medo nem teve
tempo de chegar. Não era assombro — era ternura. Ela me falou com voz de colo: “Meu
filho, não chore. A vida continua. Mamãe não te deixou, apenas mudou de lugar.”
E eu, menino, entendi sem entender — o coração compreendeu primeiro que a
cabeça.
SuperPauta: E como foi, Chico, perceber que aquele primeiro
encontro com sua mãe não era só uma lembrança, mas o início de uma missão? Como
o senhor entendeu que a mediunidade seria essa ponte entre dois mundos?
Chico Xavier: Não houve espetáculo, não houve barulho — houve
paz. E paz é assinatura do céu. Depois daquele dia, outras presenças vieram,
como quem bate à porta com respeito. Às vezes, uma palavra dentro do
pensamento. Às vezes, uma luzinha por trás dos olhos. Às vezes, um impulso de
fazer o bem sem perguntar por quê. Fui crescendo e vendo que o mundo de Deus é
maior que a parede dos nossos sentidos. Mais tarde, com estudo e disciplina — disciplina,
disciplina e disciplina — percebi que mediunidade é ponte. E ponte não se
constrói pra ser admirada, mas pra ser atravessada. A primeira visita da minha
mãe me ensinou isso: o amor não termina no cemitério; ele só troca de endereço.
Desde então, quando a saudade doía, eu lembrava da voz dela: “Meu filho, a vida
continua.” E continua mesmo, graças a Deus.
SuperPauta: E como o
espiritismo entrou na sua vida?
Chico Xavier: (olha pro
repórter com os olhos úmidos, fala baixinho) Ah… meu irmão… O espiritismo
chegou até mim do mesmo jeito que as grandes lições da vida costumam chegar:
pela dor. Foi lá pros idos de 1927. Uma das minhas irmãs adoeceu de repente,
muito aflita, atormentada por forças que ninguém sabia explicar. Era dia e
noite de sofrimento. A gente orava, chamava médico, mas o alívio não vinha. E
eu, moço ainda, sentia uma angústia grande… aquele aperto no peito de quem quer
ajudar e não sabe como. (pausa longa) Aí, um amigo, o senhor José Hermínio
Perácio, homem de fé boa, me disse: “Chico, leva sua irmã pra casa da gente.
Vamos cuidar dela com o amparo do Evangelho.” E assim foi. Fomos pra Fazenda
Maquiné, lá perto de Curvelo. Lá, ele e dona Carmem, sua esposa — mulher de
oração firme e mãos serenas — começaram o tratamento espiritual. As preces se
multiplicaram, a ambiência se encheu de perfume de flor, e o que parecia
impossível começou a mudar. Durante uma reunião, minha mãezinha — que já havia
partido há anos — se manifestou.
SuperPauta: E foi nesse momento, Chico, ouvindo novamente a
voz da sua mãe, que o senhor percebeu que aquele encontro não era apenas
consolo, mas um chamado? Que havia ali o início de uma missão maior?
Chico Xavier: A voz dela… (emocionado) era como o abraço que a
gente sente mesmo sem tocar. Ela nos falou com tanta ternura, tanta paz, que
até o medo se ajoelhou dentro da gente. Naquele instante, eu entendi. Entendi
que Deus tinha me levado ali não pra ver um milagre, mas pra aprender um
caminho. Minha irmã se restabeleceu, graças a Deus, e eu saí de lá com o
coração em reforma. Passei a estudar, estudar muito, junto de alguns amigos. Fundamos
um pequeno grupo pra ler o Evangelho, conversar, aprender — e foi nessas
reuniões, humildes mas cheias de amor, que a mediunidade começou a se abrir em
mim. A primeira vez que psicografei, parecia que o tempo tinha parado. A mão
escrevia, e o coração chorava de alegria. A partir dali, nunca mais duvidei. (olha
pro alto, com sorriso singelo) A dor, meu irmão, foi a professora que me
matriculou no espiritismo… e eu fiquei até hoje estudando. (risos suaves)
SuperPauta: A mediunidade foi fácil de aceitar?
Chico Xavier: De jeito
nenhum, meu filho! (risos) Fácil não foi, não. No começo, eu só queria ser um
menino comum, brincar de bola de gude, soltar pipa, estudar direitinho,
trabalhar, casar... essas coisas que todo mundo sonha. Mas Deus tinha outros
planos. Quando começaram as visões, as vozes, as presenças, confesso que fiquei
apavorado. Era muito novo, e aquilo me parecia mais um castigo do que uma
bênção. Tinha noite que eu cobria a cabeça com o lençol, achando que o escuro
ia esconder os espíritos — como se espírito precisasse de luz pra enxergar
(risos). Muitas vezes chorei escondido, pedindo pra ser “normal”. Mas, com o
tempo, fui entendendo que normal mesmo é servir. Cada um tem a sua tarefa na
vinha de Deus: uns plantam, outros colhem, outros consolam. E mediunidade, meu
irmão... é serviço. Nunca privilégio! Não é medalha pra exibir, é ferramenta
pra trabalhar. O médium é como o fio que conduz a corrente elétrica: se estiver
enferrujado pelo orgulho ou pela vaidade, a luz não passa. Precisa limpar o
coração todo dia pra continuar sendo canal do bem.
SuperPauta: Como foi o
encontro com Emmanuel?
Chico Xavier: (olhar
sereno, tom de respeito) Ah, Emmanuel… Foi meu grande orientador, um amigo de
outras vidas, um professor paciente e exigente. Ele apareceu certa noite,
quando eu ainda duvidava da minha própria tarefa. Não chegou com clarins nem
luzes, chegou com silêncio. E me disse com voz firme: “Meu filho, aceita o
compromisso, mas lembra-te: disciplina, disciplina e disciplina.” (pausa breve)
Não era um mentor de afagos, não… era de vigilância. Quando eu me queixava das
dificuldades, ele respondia: “Se você não pode sofrer por amor, sofra por
obrigação — que o aprendizado vem do mesmo jeito.” (ri discretamente)
E não é que vem mesmo? Com o tempo, entendi: o dom
sem disciplina vira brinquedo perigoso. A mediunidade é empréstimo divino —
Deus confia à gente um pouquinho da tarefa d’Ele, pra ver se a gente aprende a
amar servindo. E Emmanuel me ensinou isso com paciência de mestre. Hoje eu
digo: não fui eu que escolhi o caminho. Foi o caminho que me escolheu — e eu
aceitei, graças a Deus.
SuperPauta: E como é a
sensação de psicografar?
Chico Xavier: (olha pro papel imaginário, como se visse o lápis se mover)
Ah, meu irmão… é difícil
colocar em palavras o que é maior que a palavra. A
psicografia, pra mim, sempre foi como um convite de Deus pra rezar com a mão. A gente se prepara, faz uma prece, se aquieta
por dentro, e de repente parece que o pensamento vai ficando limpinho, como um
rio quando a lama assenta. A mente silencia, o coração se acende — e a alma
entra num estado de oração que não precisa de fala. É um momento de grande
doçura. Às vezes, vinha um perfume suave, cheiro de flores que não estavam ali
— flor que o espírito trazia, eu acho. Outras vezes, era uma paz tão profunda
que o tempo parecia se derreter, desaparecer. Eu já não sentia o peso da mão,
nem o som do ambiente. Era como se o lápis escrevesse sozinho, mas com carinho,
sem pressa.
SuperPauta: E quando a mensagem termina, Chico… o que fica
dentro do senhor? É cansaço, alívio, emoção? O que passa no coração de quem
acaba de servir de ponte entre dois mundos?
Chico Xavier: (voz baixa, emocionada) Fica uma ternura mansa… Uma
vontade de chorar sem tristeza. Parece que a alma tomou banho de luz. Em certos
momentos, dava vontade de agradecer aos espíritos pela confiança. Eu sabia: não
era o autor, era apenas o carteiro. E carteiro bom não lê a carta — só entrega,
com respeito. Mas é preciso cuidado, meu filho. Se o orgulho entra, bagunça
tudo. O segredo é humildade e estudo. O médium precisa vigiar o pensamento como
quem cuida de uma chama. A vaidade é vento que apaga a luz. Quando a gente
compreende isso, a psicografia deixa de ser fenômeno e vira oração viva —
oração que se move no papel, graças a Deus.
SuperPauta: E os livros?
Como surgiam tantos?
Chico Xavier: (risos
leves) Meu filho, eu nunca escrevi nada sozinho. Era instrumento, apenas isso. Os
livros vinham como chuva de mensagem boa. Romances, cartas, poemas, consolos de
mãe pra filho, de filho pra mãe… Tudo com o mesmo propósito: consolar. Consolar
é mais bonito que convencer. O papel do médium é ser ponte, não autor. Quem
escreve é o espírito. Quem lê é o homem. E quem se alivia é a alma.
SuperPauta: E o senhor nunca ficou com o dinheiro?
Chico Xavier: De jeito
nenhum! (sorri) O que vem de Deus volta pra Deus. Desde o primeiro livro, tudo
foi destinado à caridade. Eu dizia: “Quem escreve é o espírito, quem lê é o
homem, e quem recebe é o necessitado.” Dinheiro não compra paz, meu irmão. A
única moeda que vale no além é o bem repartido.
SuperPauta: O senhor
sempre trabalhou, mesmo psicografando tanto?
Chico Xavier: (ri baixinho) Trabalhei, sim, meu filho — a vida toda, graças a Deus. Mais
de quarenta anos no Ministério da Agricultura. Batendo ponto, pegando ônibus,
enfrentando sol e enchente. E, claro, levando marmita embrulhada num pano
(risos). De dia, carimbo e relatório. À noite, oração e papel. O trabalho é
oração de pé. Quando a gente cumpre o dever com boa vontade, o expediente vira
prece.
SuperPauta: Nunca pensou em parar um pouco, em descansar? De onde vinha tanta força
pra servir sem esmorecer?
Chico Xavier: (pausa longa) Tinha dia que o corpo reclamava — e com razão. Mas a
alegria de servir aliviava o peso. Porque quando a gente serve com amor, o
cansaço muda de nome: vira gratidão. Eu sempre dizia: “A gente descansa
servindo.” E é verdade. Servir é o repouso do espírito. Ajudar o outro é o
jeito mais bonito de cuidar da própria alma. O Ministério me ensinou
disciplina. A mediunidade, paciência. Um completava o outro, como o pão e o
café da manhã. E quando eu fechava o escritório e abria o centro, era como
trocar de tarefa, não de missão. No fim das contas, a ordem era a mesma: trabalhar com amor e deixar Deus assinar o
relatório. (sorri)
SuperPauta: E quando
batia o cansaço?
Chico Xavier: Ah, meu
filho, tinha noite que o corpo pedia cama e a alma pedia paciência. Aí eu
rezava e pensava: “Tudo passa.” E passa mesmo. Até a dor é visita: chega,
ensina e vai embora.
SuperPauta: Chico, no programa Pinga-Fogo, exibido pela antiga TV Tupi em 1971, o
senhor contou uma história do avião que fez todo mundo rir. O senhor pode
relembrar como foi essa experiência?
Chico Xavier: (risos)
Ah, essa história… foi em 1959. Eu já morava em
Uberaba e estava indo pra Belo Horizonte de avião. Tudo tranquilo até a escala
em Araxá. Mas depois da decolagem… o aparelho começou a dançar! Pra um lado,
pro outro — parecia mais sanfoneiro que avião. As senhoras agarraram o rosário,
os homens fecharam os olhos, e eu… (risos) eu orava baixinho, tentando mostrar
calma, mas tremia mais que o motor. De repente, ouvi o comandante dizendo: “Não
se preocupem, é só vento de cauda.” Mas, meu filho, quem tá entre o céu e a
terra não quer saber de vento — quer saber é de anjo! Foi então que Emmanuel,
meu guia, falou dentro de mim: “Você não acha melhor calar-se e dar testemunho
da fé?” E eu, desesperado: “Mas, Emmanuel, é a morte! Estamos apavorados!” E
ele: “Se vai morrer, morra com educação — sem gritar, pra não assustar os
outros.” (ri com gosto) E eu me calei. O avião se estabilizou. O padre terminou
o terço, e eu agradeci em silêncio. Naquele dia aprendi duas coisas: que a fé
também tem humor, e que morrer com educação é lição de espírito evoluído!
(risos)
SuperPauta: Que conselho o senhor dá pra quem perdeu alguém querido?
Chico Xavier: (olhar
manso, voz baixa) Meu irmão… ninguém morre. O corpo é só a roupa que a alma
deixa no varal. O amor continua, firme,
invisível — mas continua. A saudade é o amor que ficou pra nos ensinar
paciência. Ela dói, sim. Às vezes parece que a ausência é maior que o mundo. Mas
quando a gente se recolhe em oração e chama aquele nome com ternura, a vibração
chega lá. Já recebi tantas cartas de mães, pais, filhos, cada um com a mesma
dor, com a mesma pergunta: “Chico, ele ainda me ouve?” E eu respondia: ouve,
sim. O pensamento é o telefone do espírito. Quando é discado com amor, a
ligação nunca cai. Por isso eu digo: ore, converse em pensamento, faça o bem em
nome de quem partiu.
Cada gesto de caridade é uma flor que se acende no
caminho deles. O amor, meu filho, não tem cemitério — tem continuidade.
SuperPauta: E como
atravessar essa saudade?
Chico Xavier: (sorri com
doçura) Com oração e serviço, meu filho. A caridade é o melhor remédio pra alma
doente. Quando a gente ajuda alguém, o coração que chorava começa a sorrir
devagar. A dor não vai embora de um dia pro outro, mas se transforma — vira
força, vira saudade mansa, saudade boa de lembrar. Quem ama de verdade não se
separa nunca. Apenas muda de endereço. E Deus, na sua sabedoria, não apaga
laços — ele só os alonga. O reencontro vem na hora certa, e quando acontece, a
gente entende que nenhuma lágrima foi em vão.
SuperPauta: O Brasil
será mesmo o coração do mundo?
Chico Xavier: (olhos
vivos, sorriso leve) Acredito, sim, meu irmão. Mas o coração, pra pulsar
direito, precisa estar saudável. E o nosso Brasil ainda está em tratamento. É
um país abençoado — mistura de raças, de credos, de culturas. Aqui é a oficina
onde a fraternidade está sendo testada. Cada conflito é uma lição, cada crise é
uma cirurgia moral. Deus está operando o coração do Brasil. E quem ama o país
precisa ajudar nesse tratamento:
com paciência, honestidade e trabalho. O Brasil é
chamado a ser o exemplo do amor que acolhe, não da força que divide. O
Evangelho renascerá por aqui, mas precisa da nossa boa vontade. Somos
aprendizes do amor universal — e a sala de aula é essa terra imensa e bonita.
SuperPauta: Que recado
daria à juventude de hoje?
Chico Xavier: (voz firme,
doce) Meu filho, a juventude é a primavera da alma. Não deixem que o medo ou a
pressa roubem esse tempo. O mundo vai tentar convencer o jovem a desistir, a
acreditar que nada vale a pena, que tudo é interesse. Mas isso é engano. A alma
jovem tem uma força que o tempo não apaga — a capacidade de recomeçar. Estudem,
sim, mas estudem também o coração. Não se deixem levar pela vaidade do saber
sem servir. Procurem fazer o bem sem alarde, com alegria. A verdadeira
revolução é a da bondade. E o Brasil precisa de jovens que, antes de mudar o
mundo, queiram melhorar o próprio interior. O amor, quando jovem, é semente. Quando
amadurece, vira árvore de sombra larga.
SuperPauta: E se o
senhor vivesse hoje, com internet e redes sociais?
Chico Xavier: (risos)
Ah, meu irmão, eu usaria tudo isso… mas com
cuidado. A palavra, seja falada ou digitada, continua sendo semente. A gente
precisa pensar antes de postar, porque a palavra é como o perfume: pode
perfumar o ambiente ou envenená-lo. Se eu estivesse na internet, usaria pra
espalhar consolo, alegria, esperança. Pra mandar um recado de amor pra quem
anda esquecido. Mas lembraria sempre que, às vezes, o silêncio é a postagem
mais bonita. O silêncio também é mensagem — é quando o coração fala e a língua
descansa.
SuperPauta: O senhor
falava muito da palavra como oração... isso muda no digital?
Chico Xavier: Não muda
nada. A vibração é a mesma. A frase maldosa na tela é como pedra no coração. A
prece digitada também sobe, se for sincera. Cada clique é escolha espiritual.
SuperPauta: Como manter a espiritualidade no mundo corrido?
Chico Xavier: Espiritualidade
é gentileza no trânsito, é paciência no lar, é sorriso no cansaço. Orar é bom,
mas agir é melhor. O evangelho começa no gesto, não na boca.
SuperPauta: E o planeta,
Chico? Está doente?
Chico Xavier: (fica sério,
tom de compaixão) O planeta está cansado, meu irmão. A Terra é mãe — e mãe
sofre quando vê os filhos brigando. Temos explorado demais, ferido o solo,
poluído o ar, esquecendo que a natureza é o corpo de Deus vestido de verde. Cada
árvore cortada à toa é uma oração interrompida. Cada rio sujo é uma lágrima do
planeta, mas ainda há tempo. Se cada pessoa cuidar do pequeno pedaço que pisa, o
mundo inteiro se cura. O primeiro passo da ecologia é o respeito. O segundo é a
gratidão. Quando a gente aprende a agradecer a água, o alimento, a sombra, já
começou o tratamento espiritual do planeta. A Terra não pede nada impossível — só
que a gente pare de ferir quem nos alimenta.
SuperPauta: A ciência um
dia vai provar tudo?
Chico Xavier: (sorri com
doçura e ironia) Ah, meu filho… a ciência é filha de Deus também. Mas há
verdades que o microscópio não alcança. A fé não pede diploma, e a ciência,
quando é humilde, reconhece o que ainda não sabe. Elas não são inimigas — são
irmãs que ainda brigam por brinquedo. Um dia, ciência e fé vão caminhar de mãos
dadas, porque o amor é o ponto onde todas as leis se encontram. Mas até lá,
precisamos de paciência — e menos orgulho nos laboratórios e nos altares.
SuperPauta: O que é a
morte, afinal?
Chico Xavier: (voz serena,
quase um sussurro) A morte é a volta pra casa, meu irmão. O corpo fica, mas o espírito
continua. É como tirar a roupa depois de um dia cansativo: a alma respira, se
reconhece, entende o que aprendeu. O espírito acorda e diz: “Ah, então era
isso…” Morrer não é castigo — é promoção. E quem amou de verdade não perde
ninguém, só muda o horário do encontro. A morte não é fim — é intervalo. A vida
é uma só, só muda de cenário. E Deus… é o mesmo diretor amoroso de sempre.
SuperPauta: Como se
preparar pra ela?
Chico Xavier: Vivendo bem,
meu filho. Vivendo com simplicidade, perdoando logo, ajudando sempre. A gente
não leva bens, leva o bem. No além, ninguém pergunta o saldo — pergunta se você
amou, se perdoou, se serviu. O desencarne é só mudança de estação. O trem
segue. E, se fizermos a viagem com leveza, o reencontro será alegre, como quem
volta pra casa depois de uma longa jornada.
SuperPauta: Chico, se
pudesse deixar uma última imagem pro leitor...
Chico Xavier: (olha fixo,
com voz mansa e sorriso terno)
Gostaria que me lembrassem como um vizinho disposto
a ouvir. Um homem que passou pra deixar consolo, um sorriso, um café repartido.
Tudo passa — menos o amor. E no fim, o que vale é ter vivido de modo que só se
leve na bagagem a alegria de ter amado. (olha pro alto, pausa longa) A vida
continua, meu filho… sempre continua.








Nenhum comentário:
Postar um comentário